Inauguração da Fábrica de Motores Willys em 1958

Transcrição integral com grafia original do texto e fotos publicados na revista Automóveis e Acessórios, ano 13, No 148, Abril 1958, RJ.


Iniciada a fabricação de Motores a Gasolina no Brasil

Festiva inauguração da nova fábrica da Willys-Overland do Brasil S. A.

Presidentes

O presidente da República condecora com a ordem do Cruzeiro do Sul o Sr Hickman Price Jr., presidente da Willys Overland do Brasil, pelos notáveis serviços que vem prestando a esta sua segunda pátria.

Com a presença do presidente da República, de vários Ministros, do governador de São paulo, de centenas de autoridades e de líderes das classes produtoras, realizou-se em São Bernardo do Campo, à margem da Via Anchieta, nas proximidades da capital bandeirante, a 7 de março último (1958), a solene inauguração da primeira fábrica de motores a gasolina no Brasil: o nosso país atingia assim a maioridade na indústria automobilística.

Trata-se da nova fábrica da Willys-Overland do Brasil S.A., destinada a produzir os motores para os Jeeps Willys brasileiros.

O motor é o coração de uma indústria automobilística

Ao traçar o seu plano de nacionalização do Jeep Willys, a companhia brasileira partiu desta premissa: o motor é o coração de uma indústria automobilística. E assim deu vital importância a êste elemento. O GEIA reconheceu esta verdade e estabeleceu regulamentação estimulando as companhias a utilizarem-se, em seus programas de nacionalização, de motores manufaturados em nosso país.

Os investimentos da Willys-Overland do Brasil S. A.

Aprovado o plano de produção do Jeep Willys brasileiro, tomou a Willys-Overland do Brasil S. A. imediatas providências para a importação de maquinaria, equipamentos e ferramentas especiais, necessários à produção de motores para os nossos veículos. O objetivo foi cumprido, assinalando-se que a Willys Motors Inc., de Toledo, U.S.A., realizou um investimento de US$ 3,400,000.00 na Willys-Overland do Brasil S. A., representada por grande parte da maquinaria e ferramentas especiais exigidas para a fabricação do eficiente e econômico motor Willys F-Head. Foi obtido ainda um empréstimo a longo prazo de US$ 1,600,000.00 para a aquisição de maquinaria e ferramentas especiais adicionais, modernas e de comprovada eficiência, as quais permitem que uma considerável parte das operações de fabricação seja automática, e possibilitam um custo de produção relativamente baixo.

Para a instalação da fábrica de motores a Willys-Overland do Brasil S. A. fez construir um edifício que ocupa área coberta de 8.400 m2, em seu parque industrial de São Bernardo do Campo. A obra, concluída em pouco mais de 1 ano, custou cêrca de Cr$ 40.000.000,00 . A fundição dos blocos para os motores é realizado em instalações adquiridas pela Willys-Overland do Brasil S. A. para êsse fim localizados em Tabaté, Estado de São Paulo.

Capacidade de produção

A capacidade de produção da fábrica de motores, quando em plena atividade, será de aproximadamente 20.000 unidades por ano, operanndo em um só turno de 8 horas diárias. Logo que a demanda do mercado ultrapassar essa capacidade, será aumentado o número de horas de utilização da maquinaria e instalados novos equipamentos de acôrdo com as necessidades do aumento da produção.

Índices de nacionalização

Desde o inicio da produção efetiva, 74% do motor, por pêso, serão nacionais. Dos 26% restantes, a Willys-Overland do Brasil S. A. usinará em sua fábrica considerável número de peças que serão importados em bruto. Assim, approximadamente 83% dos motores serão imediatamente produzidos em nosso país.

  Foto   Operações

É a seguinte a síntese dos elementos operacionais da fábrica de motores: pátio de descarga; inspeção do material e armazenagem das peças em bruto e acabadas; usinagem do bloco do motor; usinagem do coletor e tubo de descarga; usinagem da capa do mancal; usinagem de biela; usinagem do volante; usinagem do cabeçote; usinagem do virabrequim; linha de montagem do volante; linha de montagem do virabrequim do volante e disco de fricção; linha de montagem do motor; pintura; bancos de prova do motor; expedição; usinagem da bomba d`´agua; usinagem do eixo comando de válvulas; ferramentaria, matrizes, esmerís, almoxarifado de ferramentas; manutenção de máquinas e partes elétricas.

Índices de consumo da fábrica

Alguns índices de consumo da fábrica de motores: Ferro Fundido - 1o ano 1.416 toneladas, 2o ano 2.360 toneladas, 3o ano 3.550 toneladas. Aços especiais: 1o ano 936 toneladas, 2o ano 1.580 toneladas, 3o ano 2.375 toneladas. Aço carbono: 1o ano 3.468 toneladas, 2o ano 5.800 toneladas e 3o ano 8.700 toneladas. Energia elétrica, consumo previsto anual; 2 milhões e 900 mil kw.

Constituição da Willys-Overland do Brasil S. A.

Em 2 de setembro de 1957, reunidos em Assembléia Geral Extraordinária, os acionistas da Willys-Overland do Brasil S. A. votaram um aumento de capital social, representado por ações ordinárias no valor de Cr$ 116.000.000,00, elevando-o, assim, para Cr$ 696.000.000,00. Após a colocação dêsse aumento, inteiramente constituído de capital nacional, passaram os acionistas brasileiros a representar quase 60% do capital total, sendo o seu número em todo o país, superior a 12.000 portadores individuais de ações. A participação da Willys Motors Inc., possuidora das patentes básicas de fabricação do Jeep Willys, resultou do investimento representado pela maquinaria, equipamentos e ferramentas especiais que constituem a maior parte da fábrica de motores. A participação de 60% de capital nacional na companhia constitui uma das principais conquistas da Willys-Overland do Brasil S. A., porquanto representa um novo conceito econômico em nosso país, sob o qual os brasileiros deverão participar integralmente dos lucros obtidos no Brasil, ainda que a companhia se beneficie da experiência e técnica norte-americanas.

Fabrica

Nacionalização progressiva

Com o programa de nacionalização progressiva do Jeepp Willys aprovado pelo GEIA (Grupo Executivo da Indústria Automobilística) em 30 de Julho de 1956, comprometeu-se a Willys-Overland do Brasil S. A. com o Governo Federal a alcançar as seguintes porcentagens de componentes nacionais por peso:

até 31 de dezembro de 1956 ...................... 50%
até 1 de Julho de 1957 .......................... 60%
até 1 de Julho de 1958 .......................... 75%
até 1 de Julho de 1959 .......................... 85%
até 1 de Julho de 1960 .......................... 95%

Compras no Brasil

A Willys-Overland do Brasil S. A. dispende atualmente acima de 55 milhões de cruzeiros por mês na compra de componentes, a mais de 200 firmas brasileiras. A medida que aumentar o volume de produção e se elevar a porcentagem de nacionalização do Jeep Willys, essa cifra crescerá em proporção quase geométrica. As aquisições de fornecedores locais, decorrentes do programa em execusão e de novos planos de expansão , deverão atingir em meados de 1959 a mais de Cr$ 300.000.000,00 mensais. Nessas cifras não estão computados os valores dos componentes manufaturados diretamente pela Willys-Overland do Brasil S. A.

"Boa remuneração", opina o economista Geraldo Banas - O povo brasileiro está comprando ações

O conhecido economista brasileiro sr. Geraldo Banas fêz, pela imprensa, uma análise perfeita do dinamismo da Willys-Overland.

"Do ponto de vista da empresa norte-americana", diz aquêle economista, "o investimento é lucrativo e promissor, pois esta praticamente garantido o escoamento dos 15.000 Jeeps anuais, que a fábrica de São Bernardo pretende colocar no mercado.

Trata-se de um produto de consumo, por assim dizer, forçado, que não sofrerá muito com as oscilações conjunturais que não faltarão a se manifestar tambem no Brasil.

Em todo o caso, o balanço para 1956/57 (o ano contábil termina em junho) acusa um lucro liquido de Cr$ 149,1 milhões, sôbre um capital + reservas (de todas as espécies) de Cr$ 773 milhões; ou seja, uma remuneração de 19,3%. Para uma empresa que ainda está em fase de expansão de suas instalações, êste resultado não é nada desfavorável. E mesmo se calcularmos a proporção entre o lucro liquido e o volume das vendas (Cr$ 1.313 milhões em 1956/57) chegaremos a 13,5% o que é promissor."

Acionistas indígenas

"E, seria errôneo investir contra esta taxa de remuneração. Ela deve ser boa, e poderia mesmo ultrapassar as proporções observadas no caso da Willys, porque se trata de um ramo industrial pioneiro, que necessita de mais investimentos, e para o qual precisamos canalizar todo o interêsse das potências capitalistas.

O assunto, aliás, não interessa sòmente aos inversores de fora. A Willys-Overland, através da Deltec, vendeu ações da empresa para 12.000 pessoas no Brasil, o que constitui um "record" sòmente ultrapassado pela colocação de 14.000 títulos da Refinaria União há quatro anos atrás.

Êste fato demonstra que a poupança local é suscetível de contribuir para o financiamento de empreendimentos industriais; basta que a empresa interessada prometa praticar uma gestão normal e assegurar aos acionistas uma remuneração que corresponda aos resultados financeiros obtidos.

Em outras palavras, quando há uma certa garantia de que o grupo dominante não imprime à politica de dividendos um cunho unilateral, o público brasileiro compra ações.

O exemplo da Willys é altamente interessante, e se outras emprêsas - inclusive as recém-chegadas no setor automobilístico - tiverem a mesma corragem da fábrica de São Bernardo, o problema do financiamento das obras em cruzeiros se apresentaria sob umm ângulo menos difícil.

Política inteligente

Mas as vantagens da subscrição pública local não se limitam à mobilização de fundos. Tão importante, senão mais, é a associação de 12.000 pessoas ao esfôrço de trabalho da empresa. Qualquer problema que surja, e cuja solução exija o apoio da opinião pública, terá logo de inicio a simpatia de um vasto círculo de "interessados"; fato êste que facilita a atuação da empresa no ambiente brasileiro, e que torna supérflua a criação de vastos departamentos especiais de "public relations". Esta observação ganha ainda mais relêvo, quando mencionamos que, além dos 12.000 acionistas, ("avulsos") a Willys conta com a participação de representativos grupos capitalistas nacionais, como a Gastal S. A. (Oswaldo Aranha) e a Agromotor (Quartin Barbosa)".

E assim finalizou o conhecido economista as suas oportunas considerações.

Como transcorreram as cerimônias

Às 9 horas e 25 pousou em Congonhas o avião "Viscount" da Força Aérea Brasileira que conduziu o presidente da república. Ao descer do aparelho o chefe do Govêrno foi recebido pelo chefe de cerimonial do Palácio dos Campos Elíseos, sendo cumprimentado a seguir pelo governador e pelos oficiais generais do Exército e da Aeronáutica. Nesse momento uma Bateria do Centro de Preparação de Oficiais da Reserva saudou o presidente da República com uma salva de vinte e um tiros, executando a banda de música de Exercito o Hino Nacional. A tropa, em posição de sentido, prestou as continências de estilo.

Depois de receber essas homenagens, o presidente da República passou em revista os contingentes, acompanhado do comandante do Grupamento. Êsse Grupamento era composto de três Companhias, uma do Exército, uma da Aeronáutica e uma da força Pública.

Chegando à fábrica de motores da Willys-Overland em São Bernardo do Campo, o presidente da República dirigiu-se à tribuna de honra, de onde assistiu às provas de campo realizados com Jeeps de fabricação nacional. Essas provas consistiram no emprêgo do do Jeep Willys em varias operações em terrenos ingremes, escorregadios e de areião. Foram também adaptados vários implementos agrícolas às viaturas para demonstrar seu emprego em fazendas. Foram adaptados roçadeiras, perfuradeiras, valetadeiras para até 1,80 metros de profundidade; arados, grades, plantadeiras, e adubadeiras, plainas traseiras, pás hidráulicos e bombas de irrigação. A parte final de demonstração mostrou um Jeep transformado em carro de bombeiros e outro em ambulância e suas respectivas utilizações em um incêndio simulado.

Encontravam-se também na fábrica de motores da Willys as seguintes autoridades: governadores dos Estados do Maranhão, Ceará, Piauí, Goiás, bem como dos territórios do Amapá e Rondônia.

Do local das provas, o o presidente e as autoridades dirigiram-se em Jeeps para a fábrica.

Ali, enquanto o presidennte desatava a fita simbólica inaugurando a nova indùstria, uma sirene anunciava o acontecimento, efusivamente aplaudido pelos presentes. A seguir, no palanque oficial instalado na fábrica, o bispo de Santo André, Dom Jorge Marcos de Oliveira, procedeu à benção das instalações. Depois da benção, o presidente da República e outras autoridades percorreram a fábrica.

Condecorado o presidente da Willys-Overland do Brasil S. A.

Após o discurso que proferiu, o presidente da República condecorou o sr. Hickman Price Jr. com a Ordem do Cruzeiro do Suil; no grau da cavaleiro.

O ato foi longamente aplaudido.

"Sinto-me feliz e orgulhoso por estar radicado no Brasil", disse o sr Hickman Price Jr. E acrescentou: "Darei o melhor dos meus esforços, como estou dando, para o progresso desta grande terra, grande em coragem, grande em possibilidades, grande em recursos".

  Prensa   Fábrica de transmissões e de diferenciais, o novo passo da Willys-Overland

Um dos discursos mais aplaudidos foi o do sr. Cunha Bueno, que faz parte da diretoria da companhia e que, em certo trecho fêz importantes revelações: "Nosso passo seguinte será a estamparia, será a fábrica de transmissões e diferenciais, cujas fundações lançaremos no proximo mês, neste mesmo sítio, de tal meneira que, no primeiro semestre de 1959, teremos eliminado a importação dessas peças.

A estamparia é dividida em duas partes, a primeira está compreendida na atual extensão da linha de montagem , como os senhores viram pela construção que está sendo feita.

As grandes prensas para esta parte estão presentemente em Santos, e o restante sendo embarcado na América do Norte. Isto e mais a fábrica de motores, permitirão a nacionalização de mais de 75% do Jeep Willys, em Julho.

A segunda estamparia, que está sendo investida pela Willys Motors Inc. num valor de aproximadamente três milhões de dólares, ocupará em novo edifício para a qual pretendemos iniciar trabalhos de fundação no próximo mês.

Esta será a maior estamparia da América Latina.

A poucas centenas de metros dêste local , nêste mesmo conjunto, iniciaremos as fundações no próximo mês, da primeira fábrica no Brasil de transmissões e diferenciais, totalmente integralizada.

A maquinaria e equipamentos serão constituídos de duas partes.

Já adquirimos no Brasil e presentemente possuimos maquinaria e equipamentos para esta fábrica num valor de 125 milhões de cruzeiros.

A segunda parte, isto é, o restante de aproximadamente dois milhões e trezentos mil dólares, foi adquirida no exterior"

A poucas centenas de metros dêste local , nêste mesmo conjunto, iniciaremos as fundações no próximo mês, da primeira fábrica no Brasil de transmissões e diferenciais, totalmente integralizada.

A maquinaria e equipamentos serão constituídos de duas partes.

Já adquirimos no Brasil e presentemente possuimos maquinaria e equipamentos para esta fábrica num valor de 125 milhões de cruzeiros.

A segunda parte, isto é, o restante de aproximadamente dois milhões e trezentos mil dólares, foi adquirida no exterior"

Exportação dos Jeeps brasileiros

Referiu-se ainda o sr Cunha Bueno ao plano da W-O de expportação de Jeeps brasileiros para a América Latina (plano que comentamos em nossa edição de Março).


Fonte: O texto acima foi transcrito na íntegra e com a grafia original da reportagem nas páginas 13, 14, 16, e 85 da revista Automóveis e Acessórios na edição de Abril 1958, Editora H.D. Oliveira S.A., Rua da Quitanda 20, 5o andar, Rio de Janeiro, RJ, Brasil.


Atualizado: 09 Setembro 2002

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